19 de outubro de 2012

65.


A caneta estourou  estragando o jeans da garota e inundando-o de rosa escuro. Dentro da mancha se via até algumas letras em destaque  não se sabe como surgiram no furor do acaso – quase irreconhecíveis, mas que, ainda que letras fossem, não pareciam formar palavra alguma. E foram esquecidas.
Respirou fundo  havia partículas de coragem no ar desse dia  e estourou, sim, pois há muito estava ali, no bolso da frente: inútil, esquecida, assistindo outras canetas saírem e voltarem revigoradas, úteis! "Trabalho feito", dizia uma sorridente. "Histórias para contar", regozijava a outra reluzente.
Mas um dia  Há! Um dia... "Chega!" gritou a caneta. E estourou  pôs um basta! Já não mais suportava.
E então foi finalmente requisitada, era ela a caneta pela qual a garota procurava!
Saindo do bolso escuro reconheceu o cenário que antes tanto visitava e foi sendo pela garota movida para um canto da sala.
Sorriu de alegria, revigorada, gritou para o mundo sobre o quanto esperara!
Mas foi solta e num instante, subitamente, no lixeiro ela estava.
***
Há quem diga que havia um F na mancha, um I abstrato e um M meio desengonçado.
Pobre caneta e seu fim irremediável.
***
Mas olhe só
a caneta que sou!
Eu preciso sair também,
vou estourar, você sabe...
A mente, o coração, a alma.
E derramar sobre o sofá da sala
toda tristeza acumulada,
todos os medos crescentes
e as lágrimas poupadas.

Mas espero,
como nunca esperei algo,
que uma palavra bem bonita seja formada.
E se não for,
ainda assim, tudo bem,
terei um instante inteiro
para gritar ao mundo sobre o quanto esperei.